segunda-feira, 1 de abril de 2013

Ceticismo Clássico


O Ceticismo1

            O fundador dessa escola filosófica foi Pirro (c. 360-c.272 a.C.) Estudante do pensamento brâmane2, sua escola pregava um ideia radical: a de que seria impossível conhecer verdadeiramente qualquer coisa.
            Os céticos admitiam que a realidade existia, mas afirmavam que o ser humano não teria nenhum instrumento para atingir a verdade de qualquer coisa. Em outras palavras, a filosofia deveria ser uma negação do saber, não uma busca.
            A principal consequência dessa ideia é que todos os valores sociais – que regem o comportamento e as relações entre os homens – deveriam ser desprezados. Segundo os céticos, para atingir a felicidade o indivíduo deveria dirigir uma indiferença absoluta aos costumes e aos acontecimentos da vida. O homem feliz seria aquele que tivesse atingido o estado de ataraxia, palavra grega que designa a impertutrbalidade, o estado de paz tal como é concebido pelo ceticismo.
            A própria palavra ceticismo diz respeito as ideias desses pensadores: deriva do vocábulo grego askesis, que significa “ exercício de reflexão”, “meditação”. Cético, ao pé da letra designa uma pessoa pensativa, absorvida em si mesma e, portanto, “ausente” do mundo.








1.      CHALITA, Gabriel. Vivendo a Filosofia. São Paulo: Editora Ática. 3º Ed. 2009. Páginas 69 e 70.

2.      A palavra brâmane se origina do sânscrito brahman, que significa “princípio supremo”, “essência do mundo”. Refere-se à doutrina religiosa estabelecida na Índia entre 1000 e 500 a. C. a partir dos Vedas (livros sagrados). Pregava a existência de inúmeras divindades que governariam o mundo e tinha como elemento central o sacrifício, cuja função era homenagear e obter o favor dos deuses. Por volta do século V a. C., surgiu um ramo do bramanismo, representado pelos iogues. Essa escola pregava a ideia de que os homens deveriam renunciar aos acontecimentos do mundo e aplicar-se numa prática espiritual e física por meio de ginástica e exercícios respiratórios que o pusessem em contato com a essência do Universo.

O Conhecimento em Aristóteles ou Metafísica


O Conhecimento do Mundo1

           Embora tenha sido aluno de Platão, Aristóteles construiu uma teoria do conhecimento bastante diferente daquela que seu mestre havia idealizado.
            Para Aristóteles, seria possível conhecer o mundo por meio da experiência sensorial, aplicando a razão nos dados fornecidos pelos cinco sentidos, descobrindo assim a essência das coisas, ou seja, a verdade sobre os diferentes seres.
É importante destacar, por enquanto, que segundo esse filósofo, o conhecimento é a abstração2 da natureza dos objetos e dos seres; isso resultaria num conceito, num pensamento, mas de maneira diferente da apresentada na doutrina platônica. Para o estagirita, não há um mundo onde as ideias existam por si mesmas; as ideias são o resultado de um processo conduzido pelo intelecto.
            Aristóteles  afirmava que cada ser ou objeto possui uma substância3 própria, que é o conjunto de todas suas características fundamentais, como suas dimensões, qualidades, matéria de que é feito, etc. Por meio de abstração, o homem conseguiria analisar esses atributos separadamente, mas que são inseparáveis no ser ou no objeto em si. Por exemplo, podemos observar de modo isolado a liquidez da água, mas essa propriedade não pode ser colocada à parte no plano material.
            Os seres e os objetos  também são determinados por seus acidentes4: opostas à substância, as características  acidentais são aquelas que não alteram a essência daquilo que um ser ou objeto é. Assim, a substância homem é sempre a mesma num indivíduo, independente de usa cor de pele, atura e nacionalidade (essas são apenas acidentes). Determinar a substância de algo, portanto, é conhecer, segundo Aristóteles.
            A substância de um objeto é dada por sua matéria e por sua forma. A matéria consiste nos elementos físicos que constituem a coisa.
Já a forma tem um conceito um conceito mais complexo: ela é a estrutura interna na qual a matéria está organizada, que a “modela” de modo que a coisa seja reconhecida como é.
Forma e matéria, juntas, mostram-se ao homem por meio das informações captadas por nossos sentidos. A forma “casa” é o que possibilita que distingamos essa construção de uma igreja, embora ambas sejam feitas dos mesmos materiais; pela visão detectamos as características da casa e a reconhecemos como tal.
Todas as coisas, entretanto, podem mudar, deixando de ser o que são para se transformar em outras. Como explicar dentro da doutrina Aristotélica, essas alterações nas substâncias dos seres?
Para solucionar o problema, devemos recorrer a outro para de conceitos aristotélicos> potência e ato. A primeira é uma ou várias possibilidades, presentes num determinado objeto, de ele ser transformado em outro. A madeira, por exemplo, tem a potência de ser uma cadeira, uma mesa, uma cabana, pois poderia semanipulada para dela se obter essas coisas. O ser humano tem a potência de gerar um outro ser: pela gestação, um novo indivíduo será gerado. O ato é a realização de uma potência. Assim, uma espada é uma das potências do ferro colocada em ato.
Segundo Aristóteles, tudo tende a passar da potência ao ato; tudo se move de uma para outra condição. Essa passagem sempre se daria n pela ação de forças que se originam de diferentes motores, isto é, coisas ou seres que proveriam essas mudanças. No entanto, se todo o Universo sofre transformações, o estagirita afirmava que deveria haver um primeiro motor, imóvel e imutável, que não seria nada em potência, mas ato plenamente realizado. O primeiro motor é, em última instância, aquilo de onde parte todo movimento do Universo, todas as transformações.
Ainda sobre a passagem da potência  ao ato, o filósofo explica que todos os seres são determinados por quatro causas, que explicariam como e por que cada coisa torna-se o que é. São elas:
·         Causa material: é a matéria de que o objeto é feito.
·         Causa eficiente: também denominada instrumental, é o ser (ou seres) que promove a passagem do objeto inicial da potência ao ato.
·         Causa formal: é a forma que define a coisa, que lhe dá a suas identidades.
·         Causa final: é o propósito, o objetivo, a finalidade do ser específico.
Para ilustrar esses conceitos, suponhamos que um escultor decida esculpir uma estátua da deusa Atena em mármore. O bloco de pedra que será usado para esse trabalho corresponde à causa material. O artista e seus instrumentos (como a cunha e o martelo) são a causa eficiente. Esse homem teria, em sua mente, a imagem da deusa e como pretende retratá-la – a forma da estátua, que será transferida à matéria-prima, constituindo a causa formal. A escultura servirá, por exemplo, para homenagear essa deusa; isso é a causa final.



1.       CHALITA, Gabriel. Vivendo a Filosofia. São Paulo: Editora Ática. 3º Ed. 2009. Páginas 57, 58 e 59.

2.       Provém do latim abstrahere, que significa “tirar algo de um lugar ou de um objeto, separar, roubar”. Em filosofia, abstrair significa colocar `a parte, mentalmente, as características e qualidades de um objetos de estudo, material ou não, para analisa-lo e conhece-lo.

3.       Vem do verbo latino substare, que significa “estar sob, substituir”. Aristóteles definia substância como a essência necessária do ser, aquilo que ele é, e que está relacionada como o que existe. Ao conceito de substância Aristóteles opunha o de acidente.


4.       Palavra que os veio do latim, accidens, que significa “casual, fortuito, inesperado”. Assim sendo, uma qualidade acidental é aquela que não pertence à substância do ser, embora possa pertencer ao objeto a que se refere.



           

segunda-feira, 25 de março de 2013

(2012) O que é o conhecimento?


Escrito por Fábio Luiz Daemon da Silva   
 http://llpefil-uerj.net/texdidat

O QUE É O CONHECIMENTO?
Quando falamos sobre o conhecimento é impossível não nos lembrarmos do significado da palavra “filosofia”. A filosofia sempre foi colocada como a união de duas palavras de origem grega: “philia” e “sophia”. A palavra “philia” tem como significado em português as palavras “amor” ou “amizade”. Já a palavra “sophia” tem como significado a palavra “sabedoria”. Logo, presumimos que filosofia significa um “amor ao saber”. Assim, vemos claramente que a filosofia nasceu como uma busca pela sabedoria, mais precisamente: pelo conhecimento.
O Conhecimento sempre foi o que o homem quis buscar, e a filosofia se interessou desde sempre em tentar estabelecer quais são as condições necessárias para que um conhecimento seja considerado verdadeiro ou não.
O homem sempre almejou o conhecimento. Quando o homem precisava se adaptar a um meio sempre buscou o conhecimento. O homem atuava pelo conhecimento para poder dominar e interagir na natureza, além disso, pelo conhecimento poderia se relacionar com os outros homens.
Na atualidade nos preocupamos mais com a “realidade” do que com conhecimento. Hoje em dia é comum tentarmos definir o que pode ser considerado real ou não. Entretanto, poucas vezes sabemos definir o que é um conhecimento. O que posso conhecer? Como posso conhecer? Essas perguntas geralmente causam um grande conflito em nossas mentes. Logo, entramos em um mundo repleto de conhecimentos já construídos, onde já temos intrinsicamente uma definição do que consideramos como realidade, porém nunca colocamos em pauta o que, afinal, significaria a palavra “conhecimento”.
Quando nos deparamos com a pergunta “o que é o conhecimento?”, evidentemente cairemos em questionamentos como: “como se conhece algo?”, “quem conhece?”, “por que conhecer?”, “o conhecimento verdadeiro é o subjetivo (relacionado ao sujeito que conhece o objeto) ou o objetivo (relacionado ao objeto que se deseja conhecer)?”.
Existem cinco formas de conhecimento humano: o senso comum, o mito, a teologia, a filosofia e a ciência.
O processo de conhecimento humano é histórico. Ele é construído pelos homens ao longo de todas as épocas. O homem sempre foi construindo o seu conhecimento através dos livros, documentos, contos e etc. Sempre se preocupando em passar o conhecimento para os homens das futuras gerações.
SABEDORIA X CONHECIMENTO
Entretanto, quando falamos em conhecimento sempre se levanta a questão: qual seria a diferença entre a Sabedoria e o Conhecimento?
Sócrates considerava a sabedoria como algo inato ao espírito do homem. Ela seria uma habilidade intrínseca ao homem, algo que já nasceria com o homem. Já o conhecimento para Sócrates seria o ato de procurar, encontrar os procedimentos necessários para despertar a sabedoria no homem.
Logo, vemos que a sabedoria é algo inato ao homem. Uma capacidade de ser sábio já é encontrada dentro do homem, porém para que ele a exerça é necessário que procure instrumentos necessários para despertá-la, ou seja, produza conhecimento.
A TEORIA DO CONHECIMENTO
Para que possamos entender como a filosofia se preocupou com o conhecimento e tentou defini-lo, precisamos compreender a teoria do conhecimento. A teoria do conhecimento consiste numa explicação ou interpretação filosófica do conhecimento humano. O que se pretende nessa teoria é compreender o que é o conhecimento humano, como ele é construído e qual modo de conhecimento poderá ser considerado como verdadeiro.
A teoria do conhecimento sempre tratou o conhecimento humano como uma correlação entre a consciência e o objeto, ou seja, entre o sujeito e o objeto. Essa correlação entre esses dois elementos é a essência do conhecimento. A função do sujeito consiste em apreender o objeto, e a do objeto consiste em ser apreendido pelo sujeito.
TEORIA DO CONHECIMENTO EM PLATÃO
Para entendermos a teoria do conhecimento na filosofia, precisamos entender como o conhecimento foi designado desde a Antiguidade.
No diálogo “A República”, Platão estabelece a sua teoria do conhecimento como uma exposição de uma diferença entre o sensível e o inteligível. O inteligível tem uma extensão maior que o sensível. Logo, o conhecimento inteligível é muito mais amplo que o sensível.
Para Platão há quatro modos de conhecimento: a eikasía (imagem), a pístis ou dóxa (opinião), diánoia (raciocínio) e a epistéme ou nóesis (intuição intelectual).
O primeiro modo (eikasía) é o conhecimento pelas imagens, simulacros. Indica um modo de conhecimento pelo qual são apreendidas apenas as cópias ou as imagens de uma coisa sensível.
O segundo modo (pístis ou dóxa) é a opinião formada a partir das sensações e do que ouvimos dizer. É a opinião formada após o primeiro modo (as imagens). Ela é usada quando emitimos opiniões sobre as imagens, sem conhecer o objeto verdadeiro.
O terceiro modo (diánoia) é compreender pelo pensamento. É o modo que utiliza o raciocínio. Separa os argumentos ou razões para operar pela dedução ou pela demonstração.
O quarto modo (epistéme) é o saber verdadeiro. É o nível mais alto de conhecimento. É ele que possibilita que possamos encontrar a verdadeira essência de um objeto. É através dele que conhecemos verdadeiramente o objeto. É o conhecimento adquirido da inteligência com o inteligível.
TEORIA DO CONHECIMENTO EM ARISTÓTELES
Já para Aristóteles o conhecimento tem três características principais: procurar instrumentos que permitam conhecer coisas particulares, pois somente elas que correspondem à verdadeira realidade, a ideia de que o mundo é uma totalidade hierarquicamente organizada e racional, na qual só poderá ser conhecida mediante certos princípios, tal como o principio do terceiro excluído (princípio que consiste em afirmar que não pode existir algo que seja e não seja ao mesmo tempo. Ou alguma coisa é ou não é), e por fim, a solidariedade natural das coisas, onde tudo que está na natureza está interligado, se relaciona uns com outros.
O início do processo de conhecimento inicia com nada gravado. Quando se inicia o processo do conhecimento, nada temos em mente. Nada conhecemos. Nada temos gravado em nossas mentes antes. O conhecer é apenas uma potencialidade da nossa alma. É uma capacidade que temos ligada a nossa alma, mas que não se encontra previamente. É apenas uma capacidade que temos que desenvolver. As coisas sensíveis atualizam o nosso conhecimento.
O conhecimento cresce em quantidade, qualidade e complexidade à medida que avança dos objetos simples aos mais complexos. O crescimento do conhecimento por complexidade vai quando se conhece cada vez mais os objetos, chegando a detalhes cada vez mais precisos deles.
O aprendizado que possibilita o conhecimento. O exemplo da teoria do conhecimento de Aristóteles é o da leitura: temos a potencialidade de ler. Adquirimos a capacidade ou habilidade de ler por aprendizado. Quando compreendermos a forma e o sentido dos signos escritos, exercemos perfeitamente a nossa habilidade de ler, que fora aprendida anteriormente.
TÉCNICA X PRODUZIR CONHECIMENTO
Na sociedade atual muito se discute sobre a diferença entre a técnica e o conhecimento. O trabalho da técnica é a atuação do uso do conhecimento. A importância da técnica está em facilitar a relação do homem com a realidade. A técnica ajuda o homem a se relacionar melhor com a realidade, por exemplo: computadores, celulares e etc. Para exercer o trabalho técnico é necessário gravação de fórmulas, de conceitos e etc. A técnica é a que domina a nossa sociedade atual. É ela a mais usada pelos homens na atualidade.
Já, o conhecimento implica se despojar do conhecimento pronto, do conhecimento já dado. Se usarmos somente a técnica em nossas vidas, estaríamos somente usando um conhecimento pronto, não produzindo nada, logo, estaríamos sendo apenas meros repetidores.
CONCLUSÃO
Vimos que o problema do conhecimento sempre esteve presente na sociedade, e a filosofia sempre tratou de tentar defini-lo. O conhecimento passa de uma geração para outra. É ele que possibilitará o homem se relacionar melhor com a natureza e com os outros homens. Para isso o homem criou diversos tipos de conhecimentos, são eles: o mito, a filosofia, a teologia, o senso comum e a ciência.
A teoria do conhecimento sempre estabeleceu que para que se tenha conhecimento é necessário que tenha uma correlação entre aquele que apreende um objeto e o objeto que é apreendido. É a relação entre a consciência e o objeto.
Filósofos da Antiguidade definiram o conhecimento de diversas maneiras, entre eles Platão e Aristóteles foram os que mais se destacaram. Platão acreditava que existiam quatro modos de conhecimento: o conhecimento pelas imagens, pela opinião, pela dedução ou raciocínio e pela episteme (saber verdadeiro). Sendo a última o conhecimento mais completo. Já Aristóteles pensava que o conhecimento só é possível através de uma procura por instrumentos que possam apreender os particulares, pois somente eles é que constituem a realidade; através da ideia de um mundo hierarquicamente construído; e por fim, através da ideia de que tudo na natureza se relaciona. Entretanto, tanto Aristóteles quanto Platão acreditavam no que Sócrates dizia: o saber é inato ao homem. A possibilidade de se conhecer é uma habilidade intrínseca ao homem, e somente o aprendizado é que possibilita o homem a potencializar essa habilidade já encontrada nele.
Por termos a habilidade de conhecermos algo, como afirmavam Platão, Aristóteles e Sócrates, devemos abandonar qualquer tipo de conhecimento pronto. Jamais devemos ser meros repetidores da técnica. Produzir conhecimento é diferente da técnica, esta só serve para nos facilitar no nosso cotidiano, ao nos relacionarmos com a nossa sociedade e com a natureza, já a produção do conhecimento desperta em todos nós uma habilidade inata ao homem: a sabedoria. Somente poderemos nos considerar sábios quando pudermos despertar a sabedoria pelo conhecimento, que será apreendido pelo aprendizado.
Logo, vemos que o conhecimento é importantíssimo para todos nós, pois é ele que é capaz de conseguir fazer o homem se relacionar melhor com a natureza, conhecendo-a cada vez mais.

PERGUNTAS
  1. O que é o conhecimento?
  2. Qual a relação necessária para que haja conhecimento, conforme a Teoria do Conhecimento?
  3. Porque o inteligível é mais extenso que o sensível para Platão?
  4. Explique como o conhecimento cresce para Aristóteles.
  5. Qual o modo de conhecimento verdadeiro para você? Mito, Senso Comum, Filosofia, Ciência ou Teologia? Por quê?
GLOSSÁRIO

Senso Comum
É a primeira suposta compreensão do mundo resultante de práticas sociais de uma comunidade. Descreve as crenças e proposições que aparecem como normal, sem depender de uma investigação detalhada.
Mito
É uma narrativa de caráter simbólico, relacionada a uma dada cultura. O mito procura explicar a realidade, os fenômenos naturais e as origens do Mundo e do homem por meio de deuses, semideuses e heróis. Foi primordial para o nascimento da filosofia na Grécia Antiga.
Teologia
Junção das palavras gregas theos (divindade) com a palavra grega logos (palavra, razão). É o estudo relacionado aos deuses. Um estudo pautado na divindade.
Eikasía
Palavra grega que designa simulacro, simulação, imagens, cópias. É o primeiro modo de conhecimento para Platão.
Dóxa
Palavra grega que designa opinião, crença comum. É o segundo modo de conhecimento para Platão.
Diánoia
Palavra grega composta de outras palavras gregas día (divisão, separação) e nóia (compreender pelo pensamento). Essa palavra designa o conhecimento pela dedução, pela demonstração. É o terceiro modo de conhecimento para Platão.
Epistéme
Palavra grega que ciência, saber verdadeiro. É o quarto modo de conhecimento para Platão.


O que é Filosofia?
Escrito por Pedro Henrique dos Santos Ribeiro
Publicado em http://llpefil-uerj.net/texdidat

Afinal, o que é filosofia? Eis aí um daqueles problemas difíceis, mesmo para quem se já dedica há algum tempo às investigações filosóficas. Responder tal questão, porém, é fundamental, especialmente para aqueles que irão exercer o magistério escolar. É muito natural que os estudantes do Ensino Médio se façam essa pergunta. Na verdade, muitos deles tendem a pensar que a filosofia é um mero palavreado qualquer, uma simples conversa vazia de sentido. Ao aluno preocupado com o vestibular, por sua vez, o estudo da matéria parece desnecessário e inútil, mais atrapalhando do que ajudando seu ingresso na faculdade. Sejamos honestos: quem de nós nunca ouviu por aí que o estudo filosófico é coisa de quem não bate muito bem da cabeça? Pois bem, se o professor de filosofia do Ensino Médio pretende realizar um bom trabalho, cabe a ele, antes de tudo, desfazer esses preconceitos. Sua primeira lição deve ser ensinar o que é filosofia.
Como, porém, fazer isso? Como definir a natureza do exercício filosófico? É aqui que já nos aparecem as primeiras dificuldades. De fato, nem mesmo os filósofos conseguem concordar nesta matéria. Quantas páginas e mais páginas escritas e nenhum consenso alcançado! Devemos, portanto, diminuir nossas pretensões. Não precisamos imaginar que é tarefa de um simples professor de Ensino Médio responder plenamente a uma questão tão controvertida. Devemos, pelo contrário, realizar uma tarefa mais simples. Assim, nosso objetivo não será fazer definição exaustiva da filosofia, com pretensões definitivas; mas simplesmente uma definição informal. Queremos apenas mostrar ao aluno o espírito, por assim dizer, da prática filosófica. O que faremos, antes de tudo – e este é nosso objetivo –, será uma introdução, simples, mas consistente, ao universo filosófico. Trata-se de seduzir o aluno, de estimulá-lo a percorrer conosco este caminho de estudos.
Voltamos, portanto, ao nosso ponto inicial: o que é filosofia? Ora, o modo mais intuitivo pelo qual definimos uma disciplina é a partir de seu objeto, ou seja, por aquilo que ela estuda. Assim, podemos dizer que a matemática é a ciência do número, que a física estuda as relações de forças entre os corpos naturais, a química investiga a constituição íntima dos corpos naturais, a biologia estuda os seres vivos e a sociologia estuda as relações sociais. No entanto, é impossível fazer esse tipo de definição para a filosofia. E é impossível justamente porque o objeto da investigação filosófica mudou muito ao longo da história. Questões que hoje são respondidas pela ciência já foram objeto intenso de reflexões filosóficas. Vejamos o caso de Newton, por exemplo, que é um autor que estudamos em física. Sua principal obra se chama Princípios matemáticos de Filosofia Natural. Ao descrever a lei da gravitação, Newton acreditava estar filosofando. Ele vivia em uma época em que a diferença entre filosofia e ciência não estava muito clara. O mesmo caso se aplica, por exemplo, para os filósofos medievais. Naquela época, discutir a natureza do arco-íris era uma questão filosófica. Santo Tomás de Aquino se utilizava dos termos “filosofia” e “ciência” como sinônimos.
O caminho intuitivo, que é definir a matéria pelo seu objeto, está, portanto, fechado para nós. Que fazer então diante do dilema de um conhecimento que é tão mutável historicamente? Renunciaremos à nossa tarefa? De maneira alguma. Há ainda um outro caminho aberto para nós e é este que convidaremos nosso aluno a realizar. Trata-se entender a natureza da filosofia a partir de sua gênese histórica. O que tentaremos é olhar para o primeiro filósofo da história e perceber o que ele trouxe de novo para o mundo. Este algo de novo que buscaremos identificar é, seguramente, a filosofia. Afinal, não foi à toa que ele foi reconhecido como primeiro filósofo. Se foi assim, é porque ele tinha algo de especial que o diferenciou de todos os outros seres humanos. Procuremos então identificar tal característica.
O primeiro filósofo de todos os tempos foi Tales de Mileto. Ao menos é assim que nos diz toda a tradição desde a antiguidade, havendo um grande consenso a respeito. Do próprio Tales, no entanto, não nos sobrou quase nada. Não temos sequer um escrito do pensador grego. Tudo o que sabemos dele reduz-se a duas frases que lhe são atribuídas: “Tudo é água” e “Todas as coisas estão cheias de deuses”. A história da filosofia também sempre tendeu a reconhecer a primeira como a mais importante. “Tudo é água” será, portanto, o ponto de partida de nossa reflexão. É ela o primeiro enunciado autenticamente filosófico da história.
Devemos admitir, neste ponto, a ameaça do sentimento de decepção, especialmente para aqueles que estão tendo seu primeiro contato com a filosofia. De fato, quando ouvimos a expressão “o primeiro filósofo da história” é natural que imaginemos encontrar um gênio da mais alta estatura intelectual, construtor de um brilhante sistema, capaz de responder os maiores mistérios da existência. E eis, no entanto, que estamos diante de uma simples frase: “Tudo é água”. Frase estranha, não podemos negar: aparentemente sem sentido. E para aquele aluno já indisposto com o estudo filosófico, sem dúvida alguma, uma frase decepcionante também. No entanto, por mais que esse sentimento de decepção possa ser intuitivo, ele não pode nos deter. Não é à toa que Tales foi considerado o primeiro filósofo. Há uma profunda riqueza escondida em seu pensamento e nós iremos encontrá-la. Vamos juntos ultrapassar a letra da frase e compreender o raciocínio que lhe deu origem. Vamos juntos fazer um exercício de reflexão.
O primeiro passo para compreender o raciocínio de Tales é prestarmos atenção no mundo à nossa volta. Consegue perceber que o mundo está sempre mudando? Que a realidade nunca é a mesma, que tudo sempre se transforma? Um ser humano, por exemplo: é concebido, torna-se um feto, depois um bebê, uma criança, adolescente, jovem, adulto, idoso, defunto. Por sua vez, a cadeira da escola, que parece tão fixa, está aos poucos enferrujando. Mesmo aquilo aparentemente tão firme, nosso planeta Terra, está neste momento girando em torno do sol. E onde não percebemos mudança alguma, algo continua passando: o tempo. É como naquela música de Lulu Santos, que se chama Como uma onda: “Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia. Tudo passa, tudo sempre passará. A vida vem em ondas como um mar num indo e vindo infinito. Tudo que se vê não é igual ao que a gente viu há um segundo. Tudo muda o tempo todo no mundo”. O primeiro passo então de Tales é perceber a mutabilidade do mundo.
Mas a reflexão do primeiro filósofo não pára por aqui. Tales avança mais um pouco e percebe que para haver mudança é necessário haver algo que mude. De fato, como dissemos acima, um ser humano sofre muitas transformações. João, no seu último segundo de vida, não tem provavelmente uma única célula de quando era um feto. E, no entanto, ele permanece sendo João: algo permaneceu nele, estruturando todas as suas transformações. Aliás, não fosse assim, quando cortássemos o cabelo, nossos amigos não nos reconheceriam. Se eles nos reconhecem, apesar de nossa mudança, é porque algo em nós permaneceu. Eu só posso perceber que certa coisa mudou se percebo também que algo nesta coisa permaneceu. Tales aplica este raciocínio ao mundo e conclui que se a realidade muda o tempo todo é porque existe algo que permanece em meio a todas estas transformações: existe uma unidade fundamental de todas as coisas.
Por fim, o terceiro e último passo do raciocínio de Tales é concluir que esta unidade é a água. Daí nos dizer Friedrick Nietzsche: “Assim contemplou Tales a unidade de tudo o que é: e quando quis comunicar-se, falou da água”1. Vejam: a nossa primeira impressão ao observar a frase de Tales é profundamente enganosa. Ao lermos “Tudo é água” o que mais nos chama atenção é a palavra água e, no entanto, ela não é o mais importante aqui. Na realidade, poderíamos desmembrar a primeira frase filosófica em duas: “Tudo é Um. O Um é água”. O primeiro ato de Tales não foi dizer que a unidade fundamental de todas as coisas é a água, mas sim que existe uma unidade fundamental de todas as coisas. Tanto isto é verdade que os filósofos posteriores passaram mais de um século discutindo sobre o que era a tal unidade e, no entanto, nem todos concordaram com Tales. Na verdade, mesmo aqueles que admitiram que fosse a água, a admitiram junto com outros elementos.
Podemos perceber aqui, finalmente, o que tornou Tales o primeiro filósofo da história. De fato, o que há de importante em seu pensamento não é propriamente a resposta, mas sim a pergunta que ele levantou. O que aquele homem buscou foi um princípio explicativo da realidade. Não lhe bastava saber que o mundo é assim, que as coisas mudam o tempo todo; ele desejava mais, desejava conhecer a explicação desse fato. Não lhe bastava saber o que existe, mas sim porque existe. O que distinguiu Tales, portanto, de todos os outros homens do mundo foi a sua postura diante do mundo: Tales buscava explicações. De fato, sejamos honestos, não é essa a nossa atitude cotidiana, não é? Não ficamos por aí, no dia-a-dia, querendo saber qual é a unidade fundamental de todas as coisas. Vivemos ocupados com os nossos afazeres diários e não com o sentido do universo. Queremos passar de ano, namorar aquela menina bonita, torcer para o nosso time de futebol. E, no entanto, ao olharmos para Tales percebemos que seu gesto é justamente fugir dessa nossa tendência cotidiana. Tales não quer simplesmente viver, ele quer entender aquilo que ele vive. É por isso que ele foi o primeiro filósofo. O filosofo é aquele que pergunta: “Por quê?”.
E eis que podemos finalmente encontrar a nossa definição informal de filosofia: ela é justamente esse exercício de questionamento. A filosofia é uma postura crítica diante do mundo que se caracteriza por buscar explicações para a realidade. Essa postura, uma vez que rompe com nosso senso comum, com nossa maneira cotidiana de enxergar a vida, exige esforço, atenção. Exige, sobretudo, a capacidade de ser surpreender com a realidade, de se admirar com ela. Se eu acho que a explicação das coisas é muita óbvia, eu nem sequer faço perguntas. Para relembrar a saudosa expressão de Manuel García Morente: “Aquele para quem tudo resulta muito natural, para quem tudo resulta muito fácil de entender, para quem tudo resulta muito óbvio, nunca poderá ser filósofo”2.
Não à toa, Platão e Aristóteles diziam que a filosofia nasce do thauma, palavra grega que significa justamente “espanto, admiração, surpresa”. Diz-nos Aristóteles: “De fato, os homens começaram a filosofar, agora como na origem, por causa do thauma, na medida em que, inicialmente, ficavam perplexos diante das dificuldades mais simples; em seguida, progredindo pouco a pouco, chegaram a enfrentar problemas sempre maiores, por exemplo, os problemas relativos aos fenômenos da lua e aos do sol e dos astros, ou os problemas relativos à geração de todo o universo”3. Morente, por sua vez, aponta que o filósofo deve ser como criança. De fato, que criatura no mundo questiona mais do que a criança? Para ela, tudo é novo, tudo é surpreendente, exige explicação, exige um porquê.
O próprio significado da palavra filosofia concorda com nossa definição. Com efeito, “filosofia” vem do grego e significa “amor ao saber”. O filósofo, portanto, não é aquele que tem o saber, que tem a explicação, mas sim aquele que a busca. E todos nós sabemos que o amor é uma certa postura diante do amado. Aliás, se formos confiar no que nos Cícero, nossa definição ganhará ainda mais força. Conta ele que a palavra “filosofia” foi inventada quando o rei Leonte, muito admirado com a inteligência de Pitágoras, perguntou ao mesmo como ele se definia, qual era o seu tipo de saber. Pitágoras então teria respondido que não tinha saber de tipo um específico, mas que era simplesmente filósofo, amante do saber. Eis que agora entendemos finalmente porque não conseguimos definir a atividade filosófica pelo seu objeto de estudo. É porque não é possível mesmo. É porque o exercício filosófico, nos diz Pitágoras, não se define por seu conteúdo, mas sim por uma certa atitude fundamental. É porque a filosofia não é algo que se estude, mas é algo que se vive.
Percebemos, por fim, que todos nós podemos ser filósofos. Afinal, quem nunca se perguntou se Deus existe? Ou, diante do falecimento de um ente querido, se questione o que acontece depois da morte? Ou ainda, depois de uma decepção amorosa, não se perguntou no que consiste o amor? De fato, todos nós, em algum momento, buscamos entender a realidade. No entanto, como vimos acima, essa não é nossa atitude predominante, não é nossa atitude cotidiana. Apenas em momentos muito específicos fazemos isso. Vemos, portanto, que o que nos distingue do Filósofo (assim, com “f” maiúsculo), do filósofo de ofício é o grau de intensidade das nossas reflexões. O que nos distingue de Platão e Aristóteles é que eles dedicaram a vida inteira a encontrar respostas, fizeram da busca por explicações a sua própria vida. E é por isso que nós os estudamos, na esperança de aprender algo com aqueles que trilharam esse difícil caminho antes de nós. Afinal, é para isso que serve uma aula de filosofia no Ensino Médio, para que ali, ao menos uma vez por semana, o mundo nos soe misterioso, problemático, admirável e, enfim, necessitado de explicações.
Glossário
Aristóteles: filósofo grego do século IV a. C. Discípulo de Platão por muitos anos, tornou-se posteriormente grande crítico de suas teorias. Defendia, contra seu mestre, que era possível conhecer a realidade através dos sentidos, mediante um processo de abstração. Criou a lógica, além de ter importantes contribuições em vários campos da filosofia, como a ética e a política.
Cícero: filósofo romano da antiguidade, caracterizou-se pelo seu ecletismo, isto é, a tentativa de conciliar diversas correntes filosóficas divergentes.
Friedrick Nietszche: filósofo alemão do século XIX, tornou-se um crítico implacável dos valores tradicionais da civilização ocidental, em especial do cristianismo. Seus estudos sobre os primeiros filósofos o tornaram célebre.
Santo Tomás de Aquino: filósofo e teólogo medieval do século XIII. Buscou, acima de tudo, conciliar a filosofia aristotélica com a teologia católica.
Manuel García Morente: filósofo espanhol do século passado. Tendo retornado à fé religiosa no final de sua vida, tornou-se sacerdote católico.
Pitágoras: filósofo e matemático da antiguidade, sua existência está cercada de lendas. Acreditava que toda a realidade está constituída por números. Seu pensamento originou uma religião que incluía como preceito o vegetarianismo e que defendia a reencarnação.
Platão: filósofo grego do século V a. C. Combatendo o relativismo dos sofistas, buscou demonstrar a existência de dois mundos: o mundo sensível e o mundo inteligível. O primeiro, acessível através do corpo, seria enganoso; enquanto o segundo, perfeito e imutável, alcançado somente pela alma, seria fonte do autêntico conhecimento.

Questões para debate
  1. Como é sua relação com a filosofia? Você gosta, odeia, acha interessante?
  2. Quais são as questões que mais te inquietam? O que você gostaria de entender melhor?
  3. Segundo aquilo que foi apresentado no texto, você acha que nossa relação com o estudo da história da filosofia deve ser simplesmente decorar aquilo que foi ensinado pelos grandes filósofos ou deve ser aprendermos a nos questionar a partir da leitura deles?
  4. Por tudo aquilo que você já sabe, você acha que a definição apresentada no texto, marcada em negrito, realmente explica o que é filosofia? A ciência e a religião, por exemplo, também não pretendem explicar o que é a realidade?
Bibliografia

. ARISTÓTELES. Metafísicavolume II. São Paulo: Edições Loyola, 2005, 2ª edição. In: http://books.google.com.br/books?id=BDoqyIc32msC&printsec=frontcover&hl=pt-BR&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false
. MORENTE, Manuel García. Fundamentos de Filosofia I – Lições Preliminares. São Paulo: Editora Mestre Jou, 1967. Coleção Filosofia, 3ª edição.
Os Pré-Socráticos. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973, 1ª edição.
. SPROVIERO, Mario Bruno. A Palavra "Filosofia”. In: http://www.hottopos.com/notand2/a_palavra.htm. Acessado em 28/06/2012, às 22:58.
1 Os Pré-Socráticos. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973, 1ª edição, p. 18.
2 MORENTE, Manuel García. Fundamentos de Filosofia I – Lições Preliminares. São Paulo: Editora Mestre Jou, 1967. Coleção Filosofia, 3ª edição, p. 34.
3 . ARISTÓTELES. Metafísicavolume II. São Paulo: Edições Loyola, 2005, 2ª edição, p. 11

terça-feira, 12 de março de 2013

Adaptação de A República de Platão, livro 7, Platão


Adaptação de A República de Platão, livro 7, Platão
Por Gabriel Chalita

                Vamos imaginar um grupo de pessoas morando numa caverna. Os moradores estão aí desde sua infância, presos por correntes nas penas e no pescoço. Assim, eles não conseguem mover-se nem virar a cabeça para trás; só podem ver o que se passa a sua frente. A luz que chega ao fundo da caverna vem de uma fogueira que fica sobre um monte atrás dos prisioneiros, lá fora. Entre esse fogo e os moradores da caverna, existe um caminho, com um pequeno muro, semelhante ao tabique atrás do qual os apresentadores de fantoches se colocam para exibir seus bonecos ao público.
                Agora imagine que por esse caminho as pessoas transportam sobre a cabeça objetos de todos os tipos: por exemplo, estatuetas de figuras humanas e de animais. Numa situação como essa, a única coisa que os prisioneiros poderiam ver e conhecer seriam as sombras projetadas na parede a sua frente.
                Se eles pudessem conversar entre si, diriam que eram objetos reais as sombras que estavam vendo. Além disso, quando alguém falasse lá em cima, os prisioneiros pensariam que os sons eram emitidos pelas sombras.
                Pense agora no que aconteceria se libertassem um dos presos e o forçassem a ir para fora da caverna. Ofuscado, ele sofreria, não conseguindo perceber os objetos dos quais só conhecera as sombras. Ele precisaria habituar-se à luz para olhar as coisas no exterior da caverna. A princípio, veria melhor as sombras. Depois, refletida nas águas, perceberia a imagem dos homens e dos outros seres. Só mais tarde é que conseguiria os próprios seres. Depois de passar por essa experiência, durante a noite ele poderia contemplar o céu, as estrela e a Lua, com muito mais facilidade do que o Sol e a luz do dia.
                Imagine então que esse homem voltasse à caverna e se sentasse em seu antigo lugar. Ao retornar para o fundo, ele ficaria temporariamente cego em meios às trevas. Enquanto ainda estivesse com a vista confusa, seus companheiros ririam dele se tentasse convencê-los sobre a verdadeira realidade das coisas que ali são vistas como sombras. Os prisioneiros diriam que a subida para o mundo exterior lhe prejudicara a vista e que, portanto, não valia a pena chegar até lá.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Nietzsche e a arte trágica


Nietzsche e a arte trágica
Por Bruno Tavares Assunção
llpefil-uerj.net

Friederich Nitezsche, filósofo alemão do século XIX, realiza um longo estudo acerca da arte trágica. A tragédia teria sua origem nas festas populares dedicadas ao deus Dionísio, o ditirambo, uma espécie de canto coral uma espécie de encenação composta por uma parte de narrativas e outra de coro musical. Nietzsche resgata a concepção que Aristóteles apresenta na em seu livro Poética, nesta obra Aristóteles faz uma comparação dos gêneros literários e concebe ao fim da obra a o gênero trágico como o maior de todos os gêneros. Para Aristóteles o gênero poética seria o maior de todos, pois nele a vida pode ser representada de maneira mais fiel, sendo representada fielmente, a vida consequentemente atinge a um maior número de pessoas e consequentemente de uma maneira mais enérgica, mais forte os expectadores.
A tragédia grega é o meio pelo qual as pessoas veem as suas vidas retratadas, com problemas reais, assim a tragédia grega é tida como um meio pelo qual o homem sobrevive, o meio pelo qual encontra forças para a sua vida, pois ao ver a sua vida retratada com suas questões na tragédia o homem encontra maneiras de pensar a sua própria vida, o leva a se questionar e tentar encontrar soluções para a mesma. O público não é tido apenas como um expectador, mas um sim um público-artista, pois é aquele que não exerce apenas o papel de expectador, mas sim exerce o poder da tarde que é obtido pelo seu papel de expectador em um papel transformador, o poder de transformar a sua vida.
Para Nietzsche a maior arte de todas e consequentemente a maior força está na música, que é a parte representada pelo coro na cena trágica. A música seria a única expressão artística capaz de levar o público-artista ao verdadeiro êxtase. Todo esse entusiasmo leva Nietzsche a construir uma grande admiração e a uma amizade pelo compositor alemão Richard Wagner, compositor alemão, conhecido pela grandiosidade de suas obras, grandiosidade esta até então nunca vista. Para Nietzsche, Wagner tinha resgatado o verdadeiro espírito grego, pois suas obras tratavam de temas mitológicos com verdadeira propriedade, necessitavam de grandes teatros, com uma engenharia acústica específica e ainda era necessária uma certa disposição e entrega tanto dos artistas como do público, pois geralmente as obras de Wagner duravam horas.

O Apolíneo e o Dionisíaco
Há impulsos artísticos naturais, ou seja, que fazem parte do homem, segundo Nietzsche, que estão presentes na arte trágica, o saber apolíneo, do deus Apolo, que representa a beleza, a harmonia, a proporção e o do deus Dionísio a força brutal, o êxtase, a bestialidade natural. Essas duas forças se opõem e se complementam, uma não existe sem a outra.
O povo grego cria a beleza como uma maneira de escapar da dor e do sofrimento, é aí que está o saber apolíneo, já em Dionísio o homem encontra o seu estado natural, esse êxtase dionisíaco permite ao homem esquecer o Estado Ateniense, é um estado de embriaguez, dessa forma o homem percebe o mundo triste m que vive, quando criou a beleza, para mascarar a triste verdade. No dionisíaco ocorre uma aproximação com o que Nietzsche chama de Uno-primordial, ou seja, o mundo das emoções, da intensidade. É a experiência realizada através da obra de arte que compõe o Ideal Dionisíaco, é aí que se caracteriza ao mesmo tempo o embate e a complementação do Dionisíaco e do Apolíneo, os elementos artísticos do dionisíaco são ao mesmo tempo reprimidos pelo Apolíneo e acrescentados por suas medidas. É o ideal de acrescentar ao saber Dionisíaco o saber Apolíneo. Outro conceito importante a se saber é o de Embriaguez, não uma embriaguez alcançada pelo uso de substâncias, mas embriaguez dionisíaca, um estado que alcançamos através da arte.

A Morte da Arte Trágica
A Arte Trágica se opõe à racionalidade filosófica, ambas, são criações do homem, mas enquanto a Arte Trágica se exerce de maneira positiva sobre o homem, a racionalidade é decadente, segundo Nietzsche. Eurípedes seria o primeiro responsável pela morte da arte trágica, em suas obras, exceto As Bacantes, Eurípedes teria inserido o homem comum na tragédia, ou seja, o povo grego iria ao espetáculo para assistir o seu cotidiano ser representado, o homem comum passara a ser o herói. A tragédia com Eurípedes torna-se apenas uma narrativa e é feita para o público, como uma maneira de entretenimento. Nietzsche faz duras críticas à Sócrates, ele ao mesmo tempo como o fundador da racionalidade ocidental, como também aquele que dá início a decadência do homem.
Segundo alguns relatos, Sócrates em seus últimos dias de vida na prisão teria musicado algumas fábulas de Esopo, levado pela catarse da alma, ou seja, a volta da alma em uma nova encarnação sob a forma de um outro organismo. Platão em sua obra A República faz duras críticas aos poetas e aos dramaturgos, alegando que neles não se deve confiar, pois falam de maneira a seduzir os que ouvem suas palavras. É a partir de Platão surge uma sociedade que tem a necessidade da escrita.
Para Nietzsche há uma relação entre a arte e o sofrimento na tragédia, a arte é uma imitação não da natureza, mas do processo da natureza. O público, que ele chama de público-artista, percebe através da individuação do herói trágico, o eterno, ou seja, ele percebe o âmago da existência, é o que ele chama de consolação metafísica. Por isso o trágico está ligado à alegria. É no âmago da existência que o homem percebe que há vida ainda, que nem tudo está perdido. É o que ele chama de Consolação Metafísica. A morte da Tragédia é representada principalmente pela tentativa de correção da existência, e isso é feito através da racionalidade.

Glossário:
* Apolíneo – impulso artístico, relativo ao deus grego Apolo, deus da forma, da clareza, a bela aparência; 
* Arte trágica – gênero literário originário da Grécia Antiga nas festas dedicadas ao deus Dionísio. A tragédia é caraterizada por conflitos entre deuses e o homem e surge juntamente com o gênero da comédia. 
* Dionisíaco – outro impulso artístico, que se complementa com o impulso apolíneo, diz respeito ao deus Dionísio, deus do vinho, da desmensura, do exagero, contudo é necessário o impulso apolíneo para que esse seja controlado.

 Questões:
1 – Qual a importância da tragédia na sociedade grega antiga?

2 – A partir da leitura do texto descreva os conceitos de apolíneo e dionisíaco, relatando as suas diferenças e de que maneira se complementam.

3 – Como, segundo Friedrich Nietzsche, a morte da arte trágica?

4 – Em sua opinião, a tragédia, ou o enredo de uma peça teatral é apenas uma representação, uma história ou um retrato da sociedade em que vivemos? Justifique a sua resposta.

3 – Pesquise uma peça teatral de algum autor brasileiro, descrevendo alguma questão da sociedade que é abordada na peça.
  


Referências Bibliográficas:
ARISTÓTELES. Poética. In: Coleção os Pensadores. Tradução: Eudoro de Souza. 1 Ed. São Paulo: Abril, 1973.
NIETZSCHE, Friedrich W. O Nascimento da Tragédia ou Helenismo e Pessimismo. Tradução: J. Guinsburg. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.